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Liberdade relativa

 

 

“A Liberdade é a possibilidade do isolamento. Se te é impossível viver só, nasceste escravo.”

(Fernando Pessoa)

 

Claro e evidente que não podemos negar essa assertiva, precisamos, sim, dos nossos silêncios, de momentos introspectivos e da nossa própria companhia. Esses fatores por si não se configuram uma dependência? Que “liberdade” é essa que nos impõe limites?

Não é novidade que, no período de vida que nos é concedido, muito cedo aprendemos a delinear numa sequência lógica – todas as suas etapas. A princípio com os nossos pais e, depois, com aqueles que vamos encontrando em nossa jornada, segundo as nossas opções.

Nessas etapas estão inclusos: religião, amigos, estudos, trabalho, relacionamentos, e por aí vai… Tudo funcionando ao mesmo tempo. Manter-se equilibrado nesse mundo de informações e situações, que vão surgindo no dia a dia, não é fácil.

Assim, é comum no intuito de abrandar as situações, estarmos sempre nos dobrando ao outro. Não que essa seja uma característica só de um ou de outro. Na verdade, somos todos assim. Uns mais, outros menos. Não vejo aí uma ameaça à tão famigerada “liberdade”. Posso até estar sendo ingênua, mas acredito nos dois lados da moeda. Precisamos, sim, do isolamento, mas não em tempo integral.

Somos cientes das nossas necessidades para a sobrevivência em sociedade. E, mesmo que se pregue o isolamento ou o desejemos, vez por outra, ainda assim, em algum momento da nossa vida, vamos precisar do auxílio de alguém.

Embora acredite que as pessoas, em sua sã maturidade e equilíbrio mental, sejam capazes de discernir por si só – não havendo a necessidade constante da interferência de outrem –, o nosso dia a dia tem mostrado que somos instigados a socializar os nossos sucessos e insucessos, não apenas com a família e parentes próximos, mas principalmente nas redes sociais com os amigos e o mundo, o que reforça a teoria da dependência.

Estamos sempre precisando de um aceite entre os nossos pares. A nossa dependência das convenções humanas nos faz redobrar as tendências, sejam elas passageiras ou não. Se a moda é fazer uma selfie e compartilhar nas redes sociais, acabamos aderindo a isto e, quando menos se espera, ganhamos “curtidas” pelo mundo afora… Somos escravos, sim, de tudo o que nos causa prazer!

Talvez pelo fato de utilizarmos como parâmetro um padrão alto demais – baseado em sonhos e desejos, muitas vezes inalcançáveis –, acabamos por nos frustrar diante dos resultados, nem sempre adequados à nossa bitola. Tal situação pode gerar um isolamento temporário, o suficiente para uma introspecção, nada mais!

O conceito de “liberdade” é um tanto relativo. A nossa mente vagueia independente do isolamento real, portanto a nossa liberdade está intrinsecamente ligada ao nosso modo de pensar e agir.

Podemos ser livres mesmo estando em um cárcere ou sermos cativos vivendo em liberdade. Liberdade é uma condição mental.

Em tempos de isolamento social, vivenciamos situações de tentativa de autossuficiência, contudo ficou claro que precisamos do outro, sentimos falta das pessoas, ainda que para demonstrar afeto.

Talvez liberdade seja mesmo a autonomia de escolher se precisamos ou não do outro, até que ponto dependemos das pessoas.

E o belo das coisas é percebermos que temos com quem contar se precisarmos mudar tal condição. Ter quem nos socorra, ajude, abrace.

Vanda Jacinto
Enviado por Vanda Jacinto em 08/02/2022


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Imagem de cabeçalho: raneko/flickr