Primeira comunhão atípica
No Salão Paroquial, a manhã daquele sábado estava movimentadíssima! O entre e sai de pais e alunos do catecismo não tinha fim, o dia tão esperado da “Primeira Comunhão” estava próximo. Era preciso providenciar os últimos retoques.
Embora as aulas de catequese fossem ministradas pelas beatas da Igreja, a palavra final era do pároco. Ele era quem avaliava, fechando o curso. Naquele exato momento estava havendo uma sabatina, para saber os eleitos para o grande evento do domingo próximo: “O Sacramento da Primeira Eucaristia”.
Sentada num canto, sozinha, aguardava sua vez. Na verdade, seria sabatinada duas vezes. Uma, sobre os conhecimentos: Ato de contrição, os Dez Mandamentos, Os Sacramentos e as Orações, assunto que dominava com mestria. A outra, sua maior preocupação, era para saber se o padre iria dar ou não o consentimento sobre o uso do vestido branco para a cerimônia que, na verdade, não era totalmente branco – tinha uns bordadinhos em “ponto sombra” na barra, quase invisíveis! Confiante, olhava-os de instante em instante contra a luz do sol. Com certeza o padre iria aprová-lo.
Chegou a sua vez. Como sempre, fora perfeita diante dos questionamentos. Logo após, timidamente, desembrulhou o vestido e mostrou-o ao padre. Desinteressado e torcendo os beiços, ele disse que não aprovava. Se não tem outro – decidiu ele - você fica para a próxima turma. O próximo! – gritou.
Com os olhos marejados, mal conseguia caminhar. Dobrou o vestido de qualquer jeito e rumou para casa. O caminho parecia mais longo. Não conseguia entender o porquê daquele não.
Chorava, soluçava e as lágrimas se misturavam à poeira levantada pelos carros que passavam na estrada, indiferentes à sua dor.
Chegando em casa, jogou o vestido em cima da cama, pegou a caixa de sapato, onde guardava os santinhos que ganhara por merecimento, durante o ano e rasgou-os todos. Quando a sua mãe deu pelo ocorrido, já era tarde. Um pouco mais calma, explicou tudo o que acontecera. A mãe, firme, mas, com certeza, triste com a situação, apenas disse que parasse o choro e fosse ajudá-la nos afazeres.
E, assim, sem grandes incentivos, afastou-se definitivamente da Igreja. Só retornando, já adulta, um mês antes de seu casamento religioso que, por imposição do seu pai, não teve como dele escapar.
Com o casamento civil já marcado, teve dificuldade para marcar a cerimônia religiosa, bem como o cursinho preparatório. Conseguiu marcar o casamento em uma igreja e fez o cursinho em outra.
Foram quatro finais de semana com preleções de casais, médico, advogado e, por último, com o padre da Paróquia.
Tudo ia muito bem, até que o padre mencionou a “Confissão Comunitária”, pois, diante de tantos casais, essa seria a forma utilizada.
Nem ela, nem o noivo sabiam como fazer.
Parecia estar de novo naquele caminho empoeirado, voltando da igreja com a negativa do padre embrulhada no vestido. Ela sabia, desde aquela época, que Deus – misericordioso, perfeito e bom – não se incomodaria por seu vestido não ser imaculadamente branco, pois sua fé o era. Uma fé forte, ingênua, bonita. Fé que, muitos ali, de roupas impecavelmente alvas, não possuíam. Fé que o padre abalou com apenas três letras: não. Três letras que a afastaram da Igreja por anos, mas não de sua fé em Deus. E, agora, mais uma vez, estava ali, diante de Deus, porém, novamente, um padre entre eles.
O jeito foi procurar por ele – o pároco – que, indignado, perguntou a razão do casamento no religioso. Depois de longa conversa, pareceu entender a situação e os orientou no passo a passo.
E foi assim que, dias antes da cerimônia, na missa do domingo, recebeu sua Primeira Comunhão.
O seu coração se encheu de alegria, pois realizava, mesmo que tardiamente, um sonho de criança.
Não é assídua na igreja, porém continua acreditando piamente no Deus do seu coração!
Vanda Maria Jacinto
Escritora, autora do livro Rabiscando os caminhos da prosa
v.m.j@hotmail.com
No Salão Paroquial, a manhã daquele sábado estava movimentadíssima! O entre e sai de pais e alunos do catecismo não tinha fim, o dia tão esperado da “Primeira Comunhão” estava próximo. Era preciso providenciar os últimos retoques.
Embora as aulas de catequese fossem ministradas pelas beatas da Igreja, a palavra final era do pároco. Ele era quem avaliava, fechando o curso. Naquele exato momento estava havendo uma sabatina, para saber os eleitos para o grande evento do domingo próximo: “O Sacramento da Primeira Eucaristia”.
Sentada num canto, sozinha, aguardava sua vez. Na verdade, seria sabatinada duas vezes. Uma, sobre os conhecimentos: Ato de contrição, os Dez Mandamentos, Os Sacramentos e as Orações, assunto que dominava com mestria. A outra, sua maior preocupação, era para saber se o padre iria dar ou não o consentimento sobre o uso do vestido branco para a cerimônia que, na verdade, não era totalmente branco – tinha uns bordadinhos em “ponto sombra” na barra, quase invisíveis! Confiante, olhava-os de instante em instante contra a luz do sol. Com certeza o padre iria aprová-lo.
Chegou a sua vez. Como sempre, fora perfeita diante dos questionamentos. Logo após, timidamente, desembrulhou o vestido e mostrou-o ao padre. Desinteressado e torcendo os beiços, ele disse que não aprovava. Se não tem outro – decidiu ele - você fica para a próxima turma. O próximo! – gritou.
Com os olhos marejados, mal conseguia caminhar. Dobrou o vestido de qualquer jeito e rumou para casa. O caminho parecia mais longo. Não conseguia entender o porquê daquele não.
Chorava, soluçava e as lágrimas se misturavam à poeira levantada pelos carros que passavam na estrada, indiferentes à sua dor.
Chegando em casa, jogou o vestido em cima da cama, pegou a caixa de sapato, onde guardava os santinhos que ganhara por merecimento, durante o ano e rasgou-os todos. Quando a sua mãe deu pelo ocorrido, já era tarde. Um pouco mais calma, explicou tudo o que acontecera. A mãe, firme, mas, com certeza, triste com a situação, apenas disse que parasse o choro e fosse ajudá-la nos afazeres.
E, assim, sem grandes incentivos, afastou-se definitivamente da Igreja. Só retornando, já adulta, um mês antes de seu casamento religioso que, por imposição do seu pai, não teve como dele escapar.
Com o casamento civil já marcado, teve dificuldade para marcar a cerimônia religiosa, bem como o cursinho preparatório. Conseguiu marcar o casamento em uma igreja e fez o cursinho em outra.
Foram quatro finais de semana com preleções de casais, médico, advogado e, por último, com o padre da Paróquia.
Tudo ia muito bem, até que o padre mencionou a “Confissão Comunitária”, pois, diante de tantos casais, essa seria a forma utilizada.
Nem ela, nem o noivo sabiam como fazer.
Parecia estar de novo naquele caminho empoeirado, voltando da igreja com a negativa do padre embrulhada no vestido. Ela sabia, desde aquela época, que Deus – misericordioso, perfeito e bom – não se incomodaria por seu vestido não ser imaculadamente branco, pois sua fé o era. Uma fé forte, ingênua, bonita. Fé que, muitos ali, de roupas impecavelmente alvas, não possuíam. Fé que o padre abalou com apenas três letras: não. Três letras que a afastaram da Igreja por anos, mas não de sua fé em Deus. E, agora, mais uma vez, estava ali, diante de Deus, porém, novamente, um padre entre eles.
O jeito foi procurar por ele – o pároco – que, indignado, perguntou a razão do casamento no religioso. Depois de longa conversa, pareceu entender a situação e os orientou no passo a passo.
E foi assim que, dias antes da cerimônia, na missa do domingo, recebeu sua Primeira Comunhão.
O seu coração se encheu de alegria, pois realizava, mesmo que tardiamente, um sonho de criança.
Não é assídua na igreja, porém continua acreditando piamente no Deus do seu coração!