Virando páginas
Numa manhã dessas, enquanto observava as nuvens brincando de esconde-esconde com o sol, me vi procurando possíveis imagens nas montanhas de algodão… Por mais que procurasse, consegui visualizar apenas um velho gordo e carrancudo. Nenhum bichinho sequer.
Sinceramente, acho que Deus não está mais fazendo nuvens como antigamente! Senti dificuldades em descobri-las. Fiquei pensando se seria porque o vento ligeiro foi desmanchando as imagens antes que eu pudesse concluí-las ou se porque a minha mente, já cansada, não mais favorecia a criatividade.
Deixe pra lá. Mas que pena! Demorei tanto nesse processo que, quando me dei conta, o tempo começava a se fechar e, repentinamente, começou a chover.
Embora o calor tenha aumentado sensivelmente, tive que fechar a janela. Mesmo sem gostar, liguei o ventilador e me esparramei na poltrona.
O silêncio do momento – só quebrado pelos pingos da chuva na vidraça – me deixara sonolenta. Não sei o tempo passado, mas despertei assustada, com o toque do celular. Acho que cochilei.
O sol novamente dava o ar da graça. Abri a janela. A chuva já ia longe, se perdendo no horizonte, e minha mente novamente excursionava pelos efêmeros caminhos da vida.
Sempre achei incrível a velocidade de como acontecem as coisas e de como as esquecemos também. Num piscar de olhos, o tempo mudara! O mesmo ocorrendo com as horas, os dias, os meses, os anos… E nem sempre nos damos conta das mudanças nesse meio tempo.
Sem grande esforço, eu me lembrei de um encontro recente, quase casual, com um casal de amigos. Fiquei surpresa ao constatar o tempo que havíamos ficado sem nos comunicar. Muito embora o motivo tenha sido nossa mudança de cidade; ainda assim, foram mais de trinta anos! E parecia até que havia sido um dia desses! Tivemos de folhear muito o nosso caderninho do tempo, para reviver os bons momentos passados. A cada página virada, uma história para contar. Quantos erros, quantos acertos! Mas muito aprendizado também! Hoje, nossos filhos cresceram, se formaram, casaram e alguns, já são pais.
No repasse das lembranças quase disputávamos a vez, cada um queria atualizar primeiro os momentos vividos até ali. Lógico que nos despedimos com a promessa de não mais nos distanciarmos. Mesmo porque as mídias eletrônicas têm facilitado as comunicações e estão aí à nossa disposição.
Falando em caderninho, recordei uma reflexão feita pelo Padre Fábio de Melo, sobre o seu primeiro caderno. Dizia ele que “o caderno é a metáfora da vida”, e foi, no seu primeiro caderno, que ele aprendeu que a experiência dos erros era tão importante quanto a dos acertos. Afirmando ainda que, vistos do jeito certo, nos impulsionam para o futuro e, quando os erros eram muitos, a professora sugeria virar a página. Isso nada mais é do que os nossos recomeços. Quantas vezes viramos a página da nossa vida e começamos da estaca zero? Se pensarmos bem, a cada dia nos é dada uma nova oportunidade de continuação ou recomeço.
Mudanças podem e devem ser vistas como algo benéfico; afinal, a água parada apodrece. Virar a página, reescrever, desenhar, rabiscar, planejar o futuro, sonhar, são registros importantes nas páginas de nosso caderno de vida.
As páginas de minha vida – assim como me lembro dos arabescos em cada página dos meus cadernos – também são desenhadas. Nelas, estão os meus sonhos e desejos mais importantes.