Enquanto caminho, deixo solto o pensamento, que, livre, sobrevoa os altos e baixos dos meus arquivos mentais, na intenção de uma melhor organização das ideias.
De repente, um aceno estridente de bom-dia me tira do devaneio.
“Bom dia! Nunca mais tinha visto você, mulher! Pensei que estava num navio, fazendo um cruzeiro ou viajando lá pela Europa.” — A conversa vem de uma senhorinha, que trabalha numa escola municipal aqui perto.
Impossível não retribuir o efusivo cumprimento.
Com um sorriso, apenas justifico que não caminho com uma certa frequência. Só vez em quando, daí não nos vermos diariamente.
Eu continuando a caminhada — pois não posso parar, e ela a coletar o lixo ajuntado, ainda trocamos conversa:
— Então, se a gente não se ver mais: um Feliz Natal e um bom ano! — Novamente retribuo as felicitações.
Mal me distancio, e lá me vem novamente os pensamentos. “Quantas vezes, ao passar por ali, e vê-la já terminando de varrer a calçada do colégio, ficava imaginando a sua lida diária?” Nada fácil, e, mesmo assim, sempre sorridente. Hoje percebi, pelas suas colocações, que ela também sempre imaginou o meu dia a dia. Por um acaso, ela acertou o meu roteiro nesse final de ano. Acho que ela captou a minha preocupação atual. De fato, vou viajar para bem longe.
Já a passos largos, pensei se não era de bom tom ter me demorado um pouco mais com ela; porém, diante dessa correria louca, acredito que ela também não disponibilizaria de tempo para conversas soltas.
Reflito se somos versáteis, ou seres subjugados? Acostumamo-nos e nos adaptamos a todos e a tudo, inclusive ao tempo cronometrado, que nos controla com uma facilidade assustadora.
A verdade é que, com o intuito de precisar sem prejuízo, cada passo que damos nessa vida equacionamos tudo: as horas de descanso, o nosso sono, os horários de alimentação, as caminhadas, o tempo de trabalho, de diversão. Enfim, tudo, literalmente.
Cada situação é analisada e, logisticamente, preparada para que não haja desperdício de tempo. Esse ingrato, o tempo, está sempre no comando. A velha frase muito usada, “carregar pedra enquanto descansa”, é uma prática nossa. Estamos sempre realizando várias tarefas ao mesmo tempo.
Como se não bastassem as correrias e preocupações do dia a dia, tentando dar conta de tudo, no limite das vinte e quatro horas, é chegado o final de ano, e, com ele, mais uma preocupação: a de encaixar na agenda a confraternização natalina de cada grupo dos quais fazemos parte.
Embora saibamos desses encontros, deixamos para organizá-los em cima da hora. Nesse ano, precocemente, eles já começaram. Em pleno mês de novembro! Como pode? E há quem diga que traz agouro, comemorar aniversário antes da data. E aí como fica tal história?
Tenho para mim que o motivo de tal despautério seja a necessidade de desfrutarmos pelo menos uma trégua no dia a dia, antes da contagem regressiva. Daí o medo de que os dias de dezembro não sejam suficientes para tais paradas.
Digo isso porque ouvimos de uma amiga na terça-feira última passada, na confraternização de um desses grupos, do qual sou parte integrante, de que precisamos, ao longo do ano, de mais encontros dessa natureza. Dizia ela: “Não é necessário que seja Natal para nos encontrarmos, podemos fazer isso sempre!”
Ficamos olhando um para o outro, mas, conscientes, de que é verdade. Não sei se vai vingar, no entanto prometemos que assim será.
Outra situação que me chamou a atenção é que as pessoas não querem mais brincar de “amigo secreto”.
Não sei se pelo fato de um orçamento muito justo, diante de uma inflação galopante, ou porque o motivo seja o da confraternização apenas.
Se assim for, fica a deixa para reinventarmos as brincadeiras, contanto que não deixemos se perder, ao longo do tempo, os bons hábitos da convivência.
Lembrando sempre que: “Parar é preciso!”.